sábado, 19 de fevereiro de 2011

O RANCHO FOLCLÓRICO DE FORTIOS ACTUA NA SÍRIA - 2007



PELA PRIMEIRA VEZ O FOLCLORE PORTUGÊS APRESENTA-SE NESTE PAÍS

De 16 a 26 de Agosto de 2007, o RANCHO FOLCLÓRICO de FORTIOS participou no 19º Festival  Internacional de Folclore da cidade de BOSRA. Esta participação foi fruto de contactos havidos, quando há três anos o nosso Rancho se deslocou ao Egipto.


O Festival, embora com o nome de BOSRA, uma cidade Património da Humanidade, devido à sua riqueza monumental, desenrola-se em cinco cidades: Damasco, Bosra, Homs, Allepo e Lattakia. Foi para esta cidade que nos dirigimos e onde ficámos instalados de 19 a 22.
Partimos de Fortios à 1H da manhã de Domingo rumo a Madrid-Barajas, onde tomámos o avião da Síria Air para Damasco. Eram 19H locais quando poisámos em Damasco. Recebidos   por uma Directora do Festival e pelo Guia que nos acompanharia permanentemente, pudemos, logo neste primeiro contacto, verificar a simpatia e atenção das pessoas. Resolvido o problema dos vistos, enfrentámos mais 5H de autocarro para a cidade Lattakia, uma cidade costeira, com cerca de um milhão de habitantes, já próxima da fronteira da Turquia. Era 1H do dia 20… exactamente 24 H de viagem. Compreensível o desabafo de alguém: “ quão dura e difícil é a vida de artista”!

O programa da nossa estadia, criteriosamente organizado pela representante do Ministério da Cultura "NARINE GRYGORIAN" teve o merecimento de nos pôr em contacto com a História e a contemporaneidade deste País do Médio-Oriente. Assim, logo no dia 20, retemperadas as forças, fomos visitar o Castelo de Saladino, uma impressionante fortaleza situada entre dois vales profundos que, como quase todos os monumentos militares foram sofrendo as vicissitudes e influências dos muitos povos que os ocuparam: Arameus, Persas, Caldeus, Egípcios, Romanos, Árabes, Cristãos/cruzados e Otomanos(Turcos).
De tarde, visitámos
 Ugaritt –actual Ras-Shamranada-  nada mais  nada menos que a cidade fenícia  onde foi inventado o alfabeto –a escrita- como aprendemos na escola. Foi já em meados do século XX que se iniciaram as escavações e foram encontradas as pequenas placas de metal e pedra com os sinais gráficos, recolhidas no museu nacional de Damasco. Desta cidade de UGARITT, com a área de 17 hectares, apenas 2 estão a descoberto…lá como cá nem sempre o dinheiro sobra para  a cultura! Uma visita, verdadeiramente, enriquecedora.
Dia 21, de manhã, rumámos ao longo da costa, para a cidade de TARTUS, o principal porto de saída do petróleo produzido na Síria ou vindo do Iraque. Pelo caminho pudemos admirar as bonitas praias e muitos Kms de estufas para horticultura. Para além da cidade antiga, carregada de mistério e monumentos, vimos um cemitério com mais de 7000 anos.
Regressados a Lattakia, de tarde, foi o ensaio e actuação numa bela e ampla sala de espectáculos. Connosco, actuou um  grupo folclórico da Bósnia-Hersgovina.
Terminada a estadia em Lattakia, partimos para a Capital-Damasco. Pelo caminho. Mais uma surpresa. A silhueta de um castelo dominava a planície, tendo ao fundo a fronteira com o Líbano. Perguntámos ao Guia: “O que é aquilo?” –“ O Crac dos Cavaleiros, vamos visitá-lo”- respondeu ele. A subida, demasiado íngreme, obrigou o motorista, homem muito experiente e competente a desligar o ar condicionado e, mesmo assim, ainda tememos que o autocarro conseguisse chegar lá acima. Mas chegou. Parecendo, à primeira vista, tratar-se de mais um castelo, descobrimos logo que era muito mais do que isso. Algo, verdadeiramente assombroso em grandeza, beleza e único em termos de engenharia militar. Construído no cimo da cratera de um vulcão extinto, com acessos dificílimos, tornavam-no, literalmente, inexpunhável  Podia albergar cerca de 2000  combatentes (nem mulheres nem crianças ali podiam permanecer) e 250 cavalos, sem precisar de ser reabastecido durante 1 ano. Quando Saladino, depois de ter conquistado tudo em redor, pôs cerco ao castelo, último reduto dos Cruzados, fez a proposta aos sitiados de deixá-los partir pacificamente. Estes, não mais nada para defender, partiram, um mês depois para o porto de Tripoli. Outra particularidade desta fortaleza: era um verdadeiro centro de comunicações, recebendo e enviando, em poucas horas, mensagens de e para Tripoli, Tartus, Homs, Castelo de Saladino e Antioquia, através de espelhos, fumo e fogo.
Instalados num hotel de 4 estrelas, quase no centro de Damasco, permitiu-nos um contacto fácil não só com o comércio mas também com os monumentos históricos. Depois do almoço e algum descanso, fomos, livremente, à descoberta da cidade.
O dia 23, certamente, o mais rico do ponto de vista cultural, foi todo dedicado a Damasco. Pela manhã, iniciámos as visitas no Museu Nacional; aqui, pudemos ver, admirar e descobrir o percurso de muitos povos, ao longo de 8000 anos. Seguidamente, fomos à Mesquita ( uma das 5 maiores do mundo muçulmano – Córdova, Santa Sofia em Constantinopla, Cairo e Jerusalém). Uma singularidade: Ao fundo da Mesquita, um pouco à direita está o Túmulo(?) de S. João Baptista. E porquê? Primeiro porque, primitivamente, foi uma igreja construída pelo imperador romano Teodósio; em segundo lugar, quando no séc. VIII os árabes, seguidores de Maomé chegaram à Síria, ao transformarem a igreja em mesquita, respeitaram o túmulo, porque João Baptista é também um dos profetas da sua religião. Daqui, seguimos para a Casa de Ananias, que acolheu Paulo. Este ia de Jerusalém para prender, em Damasco, os seguidores de J. Cristo.
Fomos, ainda à igrejinha que está incrustada na muralha sul onde Paulo, para fugir da ira dos judeus, foi descido por uma cesta e, assim pôr-se a salvo. Depois desta visita, e como tivemos de esperar, cerca de ½ hora pelo autocarro, junto de uma avenida de grande movimento, pudemos observar, com mais evidência, aquilo que já tínhamos notado: o verdadeiro caos do trânsito. Vimos peões, ciclistas e até automóveis atravessar 4 faixas de rodagem e seguir para outra avenida que com esta se bifurcava. E tudo isto sem businadelas histéricas, insultos ou qualquer atitude de agressividade. Nos oito dias que por lá andámos, só vimos um pequeno toque e 2 faróis quebrados.
A tarde deste dia 23 foi livre; cada um geriu o seu tempo…
Logo cedo, dia 24, partimos para Bosra, já perto da Jordânia. Aliás, esta cidade dá o nome e é a sede do Festival Internacional de Folclore – e vão 19. Era ali a nossa 2ª actuação. Mais uma surpresa deslumbrante: um anfiteatro, da época romana, quase intacto. Totalmente coberto de areia, como toda a cidade antiga, foi posto a descoberto há apenas 70 anos. Daí a razão do seu estado perfeito. Como disse atrás, todo o conjunto histórico é património da humanidade. 
Com lotação para 15000 pessoas, estava, praticamente, cheio no espectáculo da noite, cuja abertura coube ao Rancho dos Fortios. Seguidamente, actuou um conjunto musical que executou algumas peças, acompanhando depois grupos de cantares e danças, umas de carácter guerreiro outras mais românticas.
Uma nota muito agradável: a entrega e vivência da assistência, provocando a simbiose total entre assistentes e artistas, sinal do valor e compreensão de uns e outros.
Mais alguns aspectos que pudemos observar: um povo pacífico, acolhedor e atencioso. Andámos por todo o lado, mesmo em ruelas de comércio tradicional e sempre nos sentimos em segurança. Ninguém nos incomodou a pedir esmola. O policiamento era muito discreto. Polícias armados, só à porta das esquadras. No espectáculo em Bosra, dada a numerosa assistência e a presença de altas individualidades, a vigilância foi mais apertada, inclusivé, com polícias à paisana. Se à saída passámos por entre um cordão de polícias, creio, que foi mais para não nos perdermos no meio da multidão que enchia um grande espaço de diversões.
Do ponto de vista político, a Síria é governada por um regime autoritário, onde sobressai a figura do presidente Hafez al Assad, filho do anterior presidente Al Assad. Este, um dos fundadores do partido BAAS, foi “eleito” em 1970 e, sucessivamente reeleito até 2000, ano da sua morte. Os cartazes com a fotografia do Presidente, enchem, de forma obsessiva, e em todos os tamanhos, as frontarias das casas, lojas, oficinas,  hotéis, ruas, etc. Em muitos locais ao lado do pai, o anterior presidente.
Mais uma curiosidade: foi de Damasco, durante o Califado de AL WALID, no máximo esplendor do império Sírio, que um poderoso exército de dezenas de milhares de homens,  comandado por Taiik Ibn Ziad, partiu, atravessou o norte de África, passou o estreito que recebeu depois o seu nome –Geb al Tarik e em 711 derrotou os Visigodos, iniciando assim a conquista e uma presença de 700 anos. 
No dia 25, sábado, não sendo possível ir a Palmira, um oásis a 300 Kms de Damasco, um sítio arqueológico de incalculável valor histórico, subimos até à cidade de Maalulla. Esta e a cidade de  Khabab, ao sul, são as únicas cidades de população, predominantemente, católica. Na Síria, 90% da população é muçulmana. No caso de Maalulla atribuem esta marca cristã à influência de dois mosteiros, Santa Tecla e Mar Musa.
De tarde, ainda houve tempo para gastar as últimas libras Sírias. Como a noite se previa longa, tínhamos de estar no aeroporto às 3 da manhã, jantámos tarde. De caminho para o aeroporto, passámos ainda pelo monte, sobranceiro à cidade, podendo admirar a sua beleza, à noite.
Às 5,30 h iniciámos a viagem de regresso. Voo para Madrid... Autocarro para Fortios. E, se não fosse o caso de todas as malas terem ficado em Damasco, teria sido  óptima. Mas ningguém perdeu a boa disposição, até se foram fazendo piadas a propósito e também a contagem de roupas, chapéus e…paus! De modo a poder actuar, no Sábado seguinte em Campo Maior e Domingo em S. Julião.
Eram 18H em ponto quando entrámos em Fortios… mais leves! Cansados? Certamente. Mas muito felizes pelo passeio, pelo enriquecimento cultural, pelo desempenho artístico e, talvez, por aquilo que ainda possa vir…
Foi sem dúvida uma viagem de Sonho!



R. F. de Fortios / Syria - Bosra 2007